11 julho 2007

A perícia

Uma crônica escrita quando eu ainda fazia mestrado na UnB.

A perícia
Jacques Philippe Bucher

Andando no estacionamento da UnB, presenciei uma cena, não tão horrível, mas, chata. Uma moça loirinha, tipo universitária, uma flor de estudos cibernéticos. Seu carro italiano— um FIAT diga-se de passagem, aparentemente batido atrás de um outro. O segundo carro, um imponente e reluzente Corsa, cujo dono parecia ser também um universitário, camisa para dentro, talvez nesse dia ele provavelmente não estivesse usando lentes, o Maurício. Cada um encostado em seu carro, evitando olhar para a cara do outro, com pensamentos levemente xiitas. Verdadeiras caras de tacho. Estavam aparentemente esperando a perícia Meu Deus. Eis que aparece um sujeitinho saído de sei lá onde, de crônica talvez, um verdadeiro chato atazando caras de tacho.
—Bateu foi?
—Foi. Responde educadamente a moça, sem mover um músculo da face. Vendo a disposição da moça, muito sensivelmente o chato se dirige ao rapaz.
—Tem pouco tempo? O rapaz não responde. O chato volta a se dirigir à moça.
—Que coisa horrível. É chato quando acontece isso né? Uma vez aconteceu comigo, à muito tempo, perto de um túnel. Nossa, parece que amassou muito.
Os dois começam a se sentir incomodados realmente. O chato se empolga:
—Vocês estão esperando a perícia é? Aqui ela demora muito. Na minha vez foi a mesma coisa. Na semana passada vi um acidente feio, ali do outro lado, até a ambulância demorou para chegar. Sorte que não tinha nenhum ferido.
Se a ambulância chegou, mas demorou para chegar, mas não havia feridos, para que ela chegou? Ele prossegue:
—Será que o conserto vai ficar muito caro?
—Você quer calar a boca? Interrompe o rapaz, indignado.
—Nossa eu só estava querendo ser gentil. O que eu poderia fazer por vocês? É tão chato ficar esperando pela perícia uma hora dessas. Moça, você comprou o seu carro tem pouco tempo? Parece novo.
Atônita a moça começa a ficar vermelha.
—É um carro bonito, esse o seu. Mas acho que vai sair de linha. Será que você vai achar peça?
Peça rara esse sujeito. A moça segura nervosamente no molho de chaves. O rapaz sente vontade de bater no chato, e os leitores impacientes esperariam um genocídio à altura, mas ele desiste. Não que o chato fosse mais forte, não se trata disso, o fato é que cada um era mais franzino que o outro. O chato abre a boca novamente, e antes que ele pudesse completar a frase os dois entram nos respectivos carros e decidem sair em disparada. Saíram batendo pneu, sei lá como iriam fazer com a perícia. Não me perguntem. Perguntem ao chato.

Nenhum comentário: